sábado, 24 de outubro de 2009

241009 - NOTÍCIAS DO PLANALTO


Presidente Lula concede entrevista a Kennedy Alencar e Alan Marques (fotógrafo), do jornal Folha de S. Paulo, em seu gabinete no Centro Cultural Banco do Brasil. Foto: Ricardo Stuckert/PR

A crise econômica, as eleições presidenciais de 2010 e a política nacional foram os temas centrais da entrevista que o presidente Lula concedeu ao jornal Folha de S. Paulo, publicada nesta quinta-feira. Confira abaixo um resumo:
Crise econômica (…) Nós discutimos no Brasil, com vários especialistas e com especialistas também de outras partes do mundo, que o Brasil sentiria muito pouco a crise, por algumas razões: porque a economia estava sólida, porque nós tínhamos diversificado as nossas exportações e porque os bancos brasileiros eram bancos que tinham muito maior solidez e muito maior controle do Banco Central.
(…) Porque nós tomamos medidas imediatas. Imediatamente, nós liberamos R$ 100 bilhões do compulsório, para irrigar o sistema financeiro. Logo em seguida, nós fizemos com que o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal agilizassem ainda mais a liberação de crédito. Fizemos o Banco do Brasil comprar carteiras de bancos menores que estavam prejudicados, fizemos o Banco do Brasil comprar a Nossa Caixa, em São Paulo, e comprar 50% do Banco Votorantim. E por que nós fizemos isso? Porque era preciso que os bancos públicos entrassem em outra fatia do mercado. Eles não tinham expertise. Então, nós precisávamos comprar para começar a financiar, por exemplo, carro utilizado [usado].
Uma das coisas que eu tenho dito a minha inconformidade nos debates com os empresários – você já deve ter assistido – é que houve nos meses de novembro e dezembro uma parada brusca de alguns setores da economia, na minha opinião, desnecessária. Alguns setores empresariais resolveram colocar um breque de forma muito, mas muito rápida, sobretudo se você começar pelo setor automobilístico, que seguia orientação das matrizes, que estavam em uma situação muito delicada. Tinham um estoque razoável, nós estávamos em uma situação privilegiada de produção e de venda de carro, de repente, a indústria automobilística parou.
Ora, quando a indústria automobilística para, para uma cadeia produtiva que representa 24% do PIB industrial brasileiro e outros setores que tinham, inclusive, já empréstimos assegurados com o BNDES pararam, porque ninguém sabia o que ia acontecer. Ora, quando isso aconteceu, o que nós fizemos? Nós resolvemos tomar as decisões que tínhamos que tomar aqui. Fizemos as desonerações que tínhamos que fazer, fizemos a liberação do financiamento, o Meirelles colocou dinheiro da nossa reserva para facilitar os nossos exportadores e depois nós descobrimos uma outra coisa grave, que eram os derivativos feitos por algumas empresas que não pareciam que faziam derivativos. E aí foi um outro problema que nós tivemos que conversar com empresa por empresa, cuidar de discutir como financiar, como evitar que algumas empresas quebrassem e colocamos o BNDES em ação.
Eleições 2010 - Olha, não estava em discussão quem era PT mais puro-sangue ou menos puro-sangue. Não era uma questão de sanguinidade que estava sendo discutida, era uma questão de viabilidade política. Porque a Dilma é, na minha opinião, a mais competente gerente que o Estado brasileiro já teve. A capacidade de trabalho da Dilma, a competência dela e o passado político dela e o presente, me fazem garantir que a Dilma é uma excepcional candidata a presidente da República. A Dilma, além de ser uma extraordinária gestora, a Dilma é um extraordinário quadro político. Ela é um quadro político excepcional, tem firmeza ideológica, tem compromisso, tem lealdade, sabe o lado em que está. Por isso ela foi escolhida. Muito preparada para presidir o Brasil, muito preparada. E hoje conhece o Brasil como ninguém.
Deixe-me falar uma coisa. Porque uma mulher que tem a personalidade que a Dilma tem, e eu conheço bem a personalidade dela, vai exigir que eu tenha o bom senso que eu tive quando elegi o Meneguelli presidente do Sindicato de São Bernardo e quando elegi o Zé Dirceu presidente do PT: rei morto, rei posto. A Dilma, no governo, ela tem que criar a cara dela, o estilo dela e o jeito dela governar. Rei morto, rei posto, meu filho.
(…) Mas eu vou dizer para você uma coisa: a Dilma vai surpreender este país. Quem pensa que a Dilma é uma mulher grosseira, uma mulher dura, depende… Se você, na sua casa, for com uma gracinha que desgoste a sua mulher, ela vai te dar um tranco; mas se a conversa for séria, ela não vai dar. E a Dilma tem toda a clareza disso.
Amadurecimento - A pessoa aprimora. Eu vou te contar um detalhe: naquela campanha, por exemplo, eu passava o tempo inteiro falando, a minha vida inteira, vou fazer reforma agrária radical, ampla e radical sob o controle dos trabalhadores. Nós fizemos uma pesquisa e 85% do povo achava que a reforma agrária tinha que ser pacífica. Eu levei mais de 15 dias para que a minha boca pudesse proferir a palavra reforma agrária tranquila e pacífica. Essas mudanças têm que ter.
Crise no Senado - O PT teve um candidato ao Senado, que foi derrotado. Eu não entendia por que os mesmos que elegeram o Sarney, um mês depois queriam derrotá-lo. Coincidentemente, o vice não era uma pessoa que a gente possa dizer que dá mais garantia ao Estado brasileiro do que o Sarney. A manutenção do Sarney era uma questão de segurança institucional. Você viu que o Senado está calmo, está funcionando. Porque muitas vezes, Kennedy, é preciso que a gente trabalhe com juízo. O que eu acho importante em um presidente da República é que ele… Qualquer cidadão, você, o Franklin Martins, um empresário, qualquer um pode perder a cabeça. Um presidente da República não pode perder a cabeça.
Eu acho que se o Sarney caísse… porque teve muita coisa estranha, que eu não vou entrar em detalhes, porque isso acabou. Mas é engraçado, é que o DEM governou a Casa durante 14 anos, na Primeira Secretaria, isso não aparecia. Obviamente que a queda do Sarney era o único espaço de poder que a nossa oposição tinha. E aí iriam querer fazer, em vez de governabilidade, um inferno neste país. Então, eu acho que foi correta a decisão de manter o Sarney no Senado.
É que eu acho que ninguém… é verdade que ninguém está acima da lei. Mas também é importante que a gente não permita a execração das pessoas por conveniências eminentemente políticas. O Sarney foi presidente deste país, e eu acho que os ex-presidentes precisariam ser tratados como ex-presidentes, respeitados, porque essas pessoas foram instituições brasileiras. E eu achava que você não poderia banalizar a figura de um ex-presidente, porque a negação da política, Kennedy, o resultado, o que vem depois da negação da política que é pior do que o que a gente tinha. O mundo está cheio de exemplos para a gente poder.
(…) Mas eu estou querendo dizer que a relação com a política é que tem que ser uma coisa mais séria. Não adianta a gente ficar falando mal do Congresso Nacional. O Congresso Nacional é a cara do povo que foi votar no dia 3 de outubro. O que é importante é que a democracia garante que a cada quatro anos você troque.
Política internacional - Muito pelo contrário, eu não estou preocupado, sabe, nem com os judeus, nem com os árabes nesse negócio. Eu estou preocupado é com a relação do Estado Brasileiro com o Estado Iraniano. Nós temos uma relação comercial, queremos ter relação política e eu disse ao Presidente Obama, disse ao Presidente Sarkozy, disse à Primeira Ministra Angela Merkel, que a gente não vai trazer o Irã para boas causas, se a gente vai ficar encurralando ele na parede. É preciso criar espaço para conversar.
(…) Não, eu não quero me opor a Washington. Pelo contrário, pelo contrário. Quando eu propus a criação do Conselho de Defesa e quando eu propus a criação do Conselho de Combate ao Narcotráfico, Kennedy, é porque eu tinha duas coisas na cabeça: primeiro, nós precisamos nos transformar em uma zona de paz, efetivamente. Segundo, é preciso que a gente assuma a responsabilidade, enquanto América do Sul, de combater o narcotráfico, porque aí a gente vai permitir que os países consumidores cuidem dos seus consumidores.
Imprensa brasileira - (…) Estou convencido de que a imprensa nacional conhece melhor o País, até porque tem obrigação de conhecer. Mas às vezes eu vejo o comportamento de algum setor da imprensa muito ideologizado. Eu, Kennedy, você sabe que eu sou amante da democracia e sou amante da liberdade de imprensa. A maior alegria que eu tenho é que os leitores, os telespectadores e os ouvintes são os únicos censores, censuradores, que eu admito para os meios de comunicação. Eu acho que o papel da imprensa não é fiscalizar, o papel da imprensa é informar, informar.
Para ser fiscal, tem o Tribunal de Contas da União, tem a Corregedoria, tem um monte de coisas. A imprensa tem que ser o grande órgão informador da opinião pública. E essa informação, essa informação, pode ser de elogio ao governo, pode ser de denúncia ao governo, pode ser de neutralidade, pode ser de outros assuntos que não seja o governo. A única coisa que eu peço a Deus é que a imprensa informe da forma mais isenta possível. E, aí, as posições políticas sejam colocadas nos editoriais.
Artigos relacionados
Entrevista do presidente Lula ao jornal Folha de S. Paulo (22/10)
Crises econômica e política são destaque em entrevista de Lula à PBS
Paulo Bernardo: PAC 2 vai ajudar projetos da Copa 2014

Nenhum comentário: