segunda-feira, 18 de abril de 2011

CAMPEI!


Delúbio Soares (*)


Um dos acontecimentos mais marcantes da década passada e, seguramente, dos mais importantes da entrada do século XXI, foi protagonizado por duas grandes Nações: Brasil e China. Dois Estadistas visionários conduziram com segurança, discernimento e competência os rumos de suas economias, balizando o papel fundamental que elas desempenhariam nas décadas seguintes no contexto internacional e aproximaram de forma irreversível os seus destinos. Luiz Inácio Lula da Silva e Hu Jintao, não perderam a chance de dar os passos iniciais para que pudéssemos viver o excelente momento em nossas relações bilaterais.

O Brasil e a China, de forma pragmática e transparente, numa equação de co-responsabilidades e metas a serem alcançadas e cumpridas com a participação efetiva do capital privado, iniciaram uma parceria poucas vezes vista entre países de suas dimensões territoriais, importância política e interesses econômicos. A efetiva parceria entre ambos os países pode ser constatada no imenso fluxo de mercado existente nos dias de hoje em todos os setores de nossa vida: o agronegócio, a mineração, a indústria têxtil, o setor petrolífero e de combustíveis, os eletro-eletrônicos e a tecnologia da informação, a indústria aeronáutica, dentre outros tantos.

Num trabalho paciente, alicerçado em negociação de altíssimo nível, o Brasil e a China removem pouco a pouco as barreiras residuais numa relação que se intensifica ao sabor do impressionante crescimento de ambos os países. Não há mais mistério para o empresário brasileiro que desembarca em Pequim, Xangai ou Cantão, em busca de bons negócios. Nem há risco algum, além daqueles inerentes à economia de mercado, para o empreendedor chinês que buscar novas oportunidades no Brasil.

O Brasil, de 2003 para cá, deixou para trás uma década infame de idas e vindas aos balcões do FMI em situação falimentar, para experimentar uma verdadeira revolução social com a chegada de mais de 30 milhões de cidadãos à classe média. Nos tornamos, sob a égide da Era Lula, a sétima economia mundial e já estamos às portas da sexta colocação. A produção chinesa, que em 1980, detinha 1,90% no PIB global, em 2000 alcançava os 3,70% e hoje reina sob impressionantes 9,30%. Desde 2009 a China é o maior exportador do mundo; em 2010 tomou o lugar dos Estados Unidos na indústria e tornou-se a maior potência de manufaturados, com 19,8% da produção global contra 19,4% dos norte-americanos.

Nesse cenário, a visita da presidenta Dilma Rousseff à China – com pesada agenda de trabalho, mas coroada de êxito – é um marco não só nas relações bilaterais, mas na consolidação dos Bric’s, a união de nosso país à China, Rússia, Africa do Sul e Índia, as potências emergentes do cenário econômico internacional. Foi uma visita de resultados, de semeadura e de colheita, de aprofundamento de relações que amadureceram e já dão bons frutos. Mais de R$ 20 bilhões em projetos tecnológicos chineses no Brasil foram anunciados, de tal forma que um i-pad, o “tablet”, passará a ser produzido no Brasil com um preço final ao consumidor quase 40% menor do que o atual. Nova fábrica da gigante tecnológica Foxconn será construída em território nacional, muito provavelmente na região de Campinas (SP).

A ZTE e a Huawei, duas outras empresas de porte mundial, anunciaram novas fábricas no Brasil, com investimentos da ordem de R$ 316 milhões e R$ 553 milhões, respectivamente. Irão produzir, criar novos empregos, pagar impostos, gerar divisas e participar de uma economia que cresce em bases sólidas e sustentáveis, num país que optou pela economia de mercado e pela democracia com justiça social. Trocando em miúdos: os empresários chineses não poderiam escolher lugar melhor que o Brasil para investir.

A Embraer, hoje a terceira maior indústria aeronáutica internacional, atrás somente da Boeing e da Airbus, que já opera uma linha de montagem na China em conjunto com a Harbin Aviation, não só irá reforçar sua produção atual como passará a fabricar os jatos executivos Phenom 100 e 300, sucessos de vendas no Brasil, Estados Unidos e Europa.

Hu Jintao e a presidenta Dilma lançaram as bases para a continuidade de uma relação profícua e o início de um novo ciclo, ainda mais virtuoso e lucrativo para seus países. O imenso mercado chinês se abre para as exportações brasileiras, enquanto a grande potência do extremo oriente deixa claro que seu interesse no Brasil vai para muito mais além do que a soja, o minério de ferro e a celulose.

Foi nítida a mudança de postura da China: se era de colaboração, agora é de associação. Mais de 200 empresários dos mais variados segmentos de nossa economia acompanharam nossa presidenta, organizados por um dos homens públicos mais brilhantes de nosso país, o ministro Fernando Pimentel. Rodadas de negociação em todos os setores se deram com empresários chineses e autoridades governamentais. Não houve setor que não fosse analisado, produto que não fosse discutido, problema que não fosse debatido, pleito que não fosse avaliado. O resultado se fará sentir em nossa balança comercial, com o crescimento do volume de negócios entre as duas potências que mais crescem no cenário econômico mundial.

Em 2003, quando o presidente Lula tomou as rédeas de um país quebrado pelos tucanos e sem nenhuma credibilidade internacional, as exportações brasileiras para a China eram da ordem de apenas US$ 1,1 bilhão. A presidenta Dilma, após os oito anos benfazejos do governo petista, visitou uma China que importou US$ 30,8 bilhões em produtos brasileiros! E sua exitosa missão chinesa certamente agregará ainda mais a essa cifra fabulosa.

Segundo dados do IPEA, o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas, em 2009 a China tornou-se o maior parceiro comercial do Brasil, tomando um lugar que era dos Estados Unidos. O Brasil importou US$ 25,6 bilhões da China em 2010. O saldo foi um lucro macroeconômico (superávit) de US$ 5,2 bilhões. Com os EUA, o resultado no mesmo período foi um déficit de US$ 8 bilhões (vendas no valor de US$ 19 bilhões para os Estados Unidos e compras de US$ 27 bilhões). Não é preciso muito esforço para saber que o Brasil Império tinha os olhos voltados para a Europa, o Brasil do passado mirava os Estados Unidos e o Brasil do presente e do futuro tem os olhos postos na grande Nação oriental.

A China não é mais um mistério para os brasileiros, nem o Brasil uma aventura para os chineses. Existe uma similitude grande entre nossos países e nossos povos. Uma mobilidade social imensa, economias que crescem vertiginosamente, necessidades a serem supridas e grandes obras a serem realizadas. Culturas extremamente diversas, mas objetivos convergentes.

Estive no início da década passada visitando a China. Ao lado de companheiros do PT, todos convidados pelo governo chinês, visitei por quase duas semanas diversas regiões, escolas, fabricas, observando o crescimento econômico, a inclusão social, as dificuldades que eram vencidas com o esforço de um povo que tem como sua marca a sabedoria e a perseverança. Emocionei-me com a riqueza cultural daquela Nação-continente, ao visitar a Cidade Proibida, o monumental e milenar conjunto arquitetônico que o mundo conheceu nas telas do cinema através do premiado filme “O Último Imperador”, de Bernardo Bertolucci. Enxerguei nos Guerreiros de Xian, um verdadeiro exército de estátuas de terracota, o estranho simbolismo de um povo bom e cordial, mas preparado para defender seu país em qualquer situação, com qualquer sacrifício. Na Grande Muralha, avistada da lua pelos astronautas da NASA, deparei-me com a capacidade de trabalho e a persistência dos chineses. Voltei seguro de que a grande potência do hemisfério norte no século XXI estava nascendo ali. A potência emergente ao sul do Equador já era o Brasil, sob o comando do presidente Lula.

Hoje Hu Jintao e Dilma Rousseff celebram a aliança que consolida a sólida parceria de sucesso entre dois gigantes econômicos e sociais. E a palavra sucesso, em Mandarim, o idioma local mais falado, é o cruzamento de dois ideogramas: risco e oportunidade.

Recordo-me que naquele país fabuloso, ao qual admiro profundamente, estive com importantes líderes políticos em Pequim e convivi com camponeses humildes nas províncias distantes do interior. Em todos a mesma cordialidade, a mesma simpatia quando eram informados de que se tratava de um brasileiro. Invariavelmente levantavam um brinde e repetiam a palavra mágica, vinda do coração, que traduz saúde, felicidade, amizade. Recordo-me de todos eles e homenageio o grande futuro de nossa parceria com os irmãos chineses: Campei!

(*) Delúbio Soares é professor

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