sexta-feira, 27 de maio de 2011

Educação, único caminho para o futuro


* Delúbio Soares

Diferente da austeridade imposta pela educação de séculos atrás, quando o rigor da disciplina – muitas vezes com severos castigos corporais – era o que imperava na condução do ensino, pensar hoje a educação é uma tarefa que precisa ser feita com sensibilidade, razão, forte sentido humanista e, acima de tudo, vontade política.

A educação ultrapassa os limites dos abnegados professores batalhando na sala de aula, e vai para muito além dos limites físicos de nossas escolas. Essa palavrinha mágica abre portas, desenha o destino e tange no horizonte o futuro num sopro de anseio e vontade. A educação é emancipação social, econômica, política e ideológica. A educação é o princípio da cidadania e a consolidação dos povos como nações.

Não por acaso, a educação é a área da administração pública que, por lei, deve receber o maior investimento dos governos em seus orçamentos. Desde a formação do movimento sindical, em 1979, e mais à frente com a redemocratização do País, na década de 1980, a educação avançou em determinados pontos e ficou engessada em outros, num contexto complexo e desafiador. Os professores passaram a propor, com mais audácia, novos caminhos para a educação, adequando-a, cada um ao seu modo de pensar, a modelos que o sistema público não conseguiu absorver.

A começar pela estrutura física das escolas, que é a mesma desde quando fui aluno no saudoso Lyceu de Goiânia. Apenas recentemente ouvimos falar em Escola em Tempo Integral, algo que já existe há anos na Europa. A distância da política nas escolas, sempre trancada nos gabinetes, também é fator preocupante de comprometimento do setor público com essa importante área que já foi, em parte, tomada pela iniciativa privada.

Os problemas da educação começam no ensino básico. Essa fase essencial em nossas vidas, onde estão as raízes do interesse humano pelo conhecimento e da nossa própria personalidade, continua “enciclopédica”, tradicional e voltada para métodos antiquados, dissociados da realidade e dos tempos difíceis e desafiadores em que vivemos. Um ensino ainda dentro de padrões arcaicos de educação, onde os alunos não veem aplicabilidade naquilo que lhes é ensinado, aprendendo coisas que de nada lhes servirão na vida prática durante os cursos primário e secundário, gerando reflexos negativos quando chegam na universidade, sem uma base mais sólida e consistente.

Infelizmente, o Brasil apresenta outra deficiência crônica quanto ao ensino público superior. Deficiência que começou ainda no Brasil Colônia e se arrastou até os dias de hoje, tornando-se agora num nó que precisa ser desatado por uma profunda reforma universitária. Por falta de planejamento e visão de futuro, o País não teve como absorver a quantidade de alunos que estava saindo do ensino médio e ingressando no curso superior. Não existiam vagas para todos, e o País começou a apresentar impressionante demanda reprimida. O crescimento dessa demanda pode ser atribuído a dois fatores: o próprio aumento vegetativo da população e a necessidade cada dia mais frequente de profissionais e mão-de-obra qualificada.

Não existia por parte da iniciativa privada interesse maior em realizar investimentos de porte nessa área. As exigências do MEC eram muitas, dificultando a possibilidade de grupos educacionais investirem no setor. Para se constituir uma faculdade, eram necessários laboratórios específicos, nem todos os cursos eram liberados, e, os que eram, sofriam limitação no número de vagas a serem oferecidas. Resultado: o interesse em se investir na educação superior era quase nulo.

Em 1987, o Ministério da Educação ampliou a facilidade de abertura das instituições particulares de ensino superior, diminuindo exigências e possibilitando o aumento do número de pessoas que ingressaram nas universidades. Só para se ter uma ideia, depois dessa medida o número de faculdades particulares aumentou mais de 300%, de 1987 a 1996, possibilitando que mais e mais estudantes brasileiros pudessem se formar, trabalhando de dia, estudando à noite e ampliando os seus horizontes de vida.

Se por um lado essa medida permitiu o aumento no número de trabalhadores com curso superior no País, também é verdade que a proliferação sem limites de faculdades particulares, com cursos (não todos) abaixo do padrão de qualidade, colocou no mercado uma pequena parcela de diplomados sem maior qualificação. Mas nem isso diminuiu o progresso alcançado e os milhares de excelentes profissionais que saem a cada ano dos bancos das universidades públicas ou particulares.

Há uma peça fundamental nessa engrenagem abençoada da educação, desde o jardim da infância até a pós-graduação nas universidades: o professor, esse missionário tantas vezes incompreendido, mal pago, enfrentando dificuldades de toda ordem, mas dando conta do seu recado! Os mestres desse Brasil gigantesco, seja a professorinha em começo de carreira lá nas margens do Araguaia, seja o consagrado catedrático das melhores universidades de nível internacional, são patrimônio inestimável, intocável e indispensável do povo brasileiro. Nem os pisos salariais baixíssimos, nem as escolas em petição de miséria, nem a falta de giz, nem os quilômetros de estradas de terra, com lama ou poeira, são empecilhos para que esses brasileiros da melhor qualidade forjem as gerações do futuro. Benditos os professores!

Otimista, percebo algumas mudanças na educação tanto em Goiás quanto no Brasil. As transformações apresentadas pelo Exame Nacional do Ensino Médio, por exemplo, dão um primeiro e importante passo para uma nova filosofia da educação, com reflexos positivos ao ensino superior. Primeiro, por tirar o aluno do vício enciclopédico, com aplicação das provas “em cima” de áreas do conhecimento, exigindo habilidades e competência do estudante. Aí está sendo edificada uma sólida base para o futuro de nossos estudantes que é, também, o futuro do próprio País.

A eleição direta para diretores das escolas públicas, outra conquista do movimento sindical e da comunidade escolar, é mais um avanço na educação. Da mesma forma, a eleição direta dos reitores modernizou a vida universitária, democratizando-a e oxigenando-a.


O processo democrático é um momento importante, único e transparente, onde os pais discutem lá dentro da escola – no que chamamos de gestão participativa – qual o modelo de ensino que querem para os seus filhos, concretizando mais ainda o exercício da cidadania e a sedimentação de um modelo democrático e eficiente de se educar para a vida e o futuro. Sem envolver a sociedade nos assuntos ligados ao meio escolar, as decisões eram tomadas “de cima para baixo”, estabelecidas conforme as conveniências políticas dos governantes, prejudicando seriamente a qualidade do ensino ministrado aos educandos e o ânimo dos educadores.

Da mesma forma, o programa de Educação de Jovens e Adultos, o EJA, fez com que o número de analfabetos caísse. Quantos pais e mães de famílias, muitos com filhos inclusive formados, redescobrem o mundo através do alfabeto! Algo que antes não fazia muita falta – após anos de costume –, hoje se torna indispensável, valoroso, formidável, bonito e mágico. Lembro-me do poeta Thiago de Mello ao dizer da alegria nos olhos de quem aprendeu a ler.

O Brasil está seguindo rumo ao seu destino de grandeza. Nossas riquezas naturais, a beleza de nossa terra, a grandeza de nosso povo, a história feita a golpes de bravura e patriotismo, nada disso valeu ou valerá se não investirmos até o último centavo numa educação sólida, com o professor valorizado e o estudante bem preparado. Não por acaso, esse País deu ao mundo alguns dos maiores educadores de todos os tempos: Anísio Teixeira, Paulo Freire, Darcy Ribeiro e Milton Santos. Nós sabemos educar, temos que fazê-lo e já não temos nenhuma dúvida: a educação é o único caminho para o futuro.

Delúbio Soares é professor

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Nota: republicação desse artigo, originalmente publicado em agosto de 2009.

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