quarta-feira, 10 de novembro de 2010

UM POUCO DA HISTÓRIA DE DOM HELDER CÂMARA

Recentemente, tive o prazer de assistir a um documentário sobre a vida de Dom Hélder Câmara, um filme chamado "O Santo Rebelde", que mostra a história dele e a importância que ele teve para o país e para o mundo. Conhecia a história dele por alto, mas fiquei impressionado depois de ter assistido ao filme. Achei interessante procurar um resumo da vida dele e enviar para que você possa publicar no blog ou no jornal, ou até mesmo ler na RPS, para que mais pessoas possam conhecer quem foi essa pessoa que lutou pelos pobres e enfrentou até a ditadura para defender classes sociais mais necessitadas.

Abaixo está o resumo.

Dom Helder Câmara, um marco na Igreja do Brasil

Dom Helder Câmara foi, sem dúvida, um marco na Igreja do Brasil dos últimos 50 anos, que com seu exemplo e modo de agir, ajudou a mudar profundamente. Sua influência não se limitou ao Brasil: as numerosas viagens que fez ao exterior, às vezes dificultadas por mal-entendidos das autoridades militares e religiosas, fizeram dele uma figura mundialmente conhecida, amada e não pouco contestada.
Foi um dos idealizadores da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), organização copiada por bispos de outros países, e seu primeiro presidente. No Rio de Janeiro, atuou como bispo coadjuntor e, em Olinda e Recife, como arcebispo.

Pioneiro da Teologia da Libertação

"Quando dou de comer aos pobres, chamam-me santo, quando respondo porque é que os pobres têm fome - chamam-me comunista": foi assim que dom Helder resumiu suas dificuldades com as autoridades políticas e religiosas, quando era contestado a propósito de sua obra social e profética em favor de uma maior igualdade e justiça no país e dentro da Igreja. Não raramente se referiam a ele como o "bispo vermelho", especialmente nos duros tempos da ditadura.
Ele desejava uma Igreja mais participativa, orientada para a defesa dos pobres e a favor dos movimentos sociais. Quando foi substituído, em 1985, em seu serviço como arcebispo de Olinda e Recife, retirou-se para viver de maneira simples, coerente, até o fim da vida, com seu posicionamento a respeito da pobreza. Sua batina branca era surrada, celebrava suas missas sem pompas, morava numa casa modesta na periferia da cidade do Recife; dizem que nunca aceitou um convite para comer em restaurantes.
Sua obra, de fato, não o apresenta como teólogo, filósofo ou revolucionário teórico, mas como um pastor, no sentido mais amplos da palavra, preocupado com o bem-estar social e religioso do povo que ele amava.
Sua atuação transformadora começou a se manifestar, quando foi nomeado bispo auxiliar do Rio de Janeiro, aos 43 anos. Além de ter sido um dos fundadores da CNBB (1952), também o foi da Conferência Episcopal latino-americana (CELAM). No inicio dos anos 60, dom Helder dedicou-se à preparação do Concílio Vaticano II convocado por João XXIII.

Um legado de obras sociais

Realizando seus sonhos e suas aspirações de justiça social e caridade, dom Helder deixou várias obras como a Obra do Frei Francisco, criada no Rio de Janeiro; iniciou o Banco da Providência, hoje ampliado, que centralizava doações e as distribuía entre a população pobre. Também criou no Rio de Janeiro um projeto de urbanização de favelas, conhecido como Cruzada São Sebastião.
Em Pernambuco, realizou a primeira experiência de reforma agrária, comprando terras na Zona da Mata e assentando trabalhadores rurais.

Ardente defensor dos direitos humanos

Depois do golpe militar, após um primeiro período de convivência pacífica com o exército, ao ver a violação brutal dos direito humanos com a caça aos chamados comunistas, dom Helder passou a atuar em defesa dos presos políticos e contra a tortura no Brasil, cuja existência o governo militar procurava negar de todas as formas. Foi o período em que enfrentou as maiores dificuldades, mas também de maior projeção no exterior, tendo sido acusado pelos militares e por parte do clero conservador de promover atividades comunistas no País. O religioso passou a ser visto como simpatizante da esquerda e seu trabalho em defesa de uma Igreja mais aberta incomodava o regime militar. Através de documentos secretos, divulgados no livro "Dom Helder Câmara - entre o poder e a profecia", de Nelson Piletti e Walter Praxedes, descobriu-se que o governo Médici (1969-1974) organizou uma campanha contra a escolha do religioso para o Nobel da Paz, indicação promovida pelo episcopado alemão.
O bispo dos pobres soube atrair as atenções de todos os que trabalham e sofrem em favor de uma sociedade mais justa, não importa qual seja seu credo. Por isso, publicamos aqui parte de um artigo de Alexandre Gomes, muçulmano praticante, em homenagem a Dom Helder.

A solidariedade radical de Dom Helder Câmara

Alexandre Gomes

"Todas as revoluções não são obrigatoriamente boas (...) mas a história mostra que algumas eram necessárias e produziram bons frutos". (Dom Helder Câmara)
Pode parecer estranho, e realmente deve ser, que alguém fora do meio católico, ligado a outra fé, se sensibilize com o falecimento desta notável figura humana que foi o arcebispo de Olinda e Recife. Mas é certo que esta estranheza só é realmente estranha a quem não o conheceu.
Ainda que recorrendo ao que provavelmente será um chavão na imprensa nos próximos dias, é impossível não ver o contraste entre a figura meiga e franzina do arcebispo frente a toda a sua força interior. Homem incapaz de conhecer o medo - o que demonstra sobretudo a intensidade da sua fé e a certeza de estar agindo com correção - dom Helder Câmara teve a coragem de enfrentar tanto os algozes do regime militar como as forças conservadoras dentro da hierarquia da qual fez parte.
Jamais perguntou se os perseguidos políticos que defendia eram católicos, protestantes, judeus ou ateus: defendia-os não por um sentimento corporativo, mas sobretudo porque nele os valores humanos - e cristãos - estavam enraizados demais para fazer esta distinção. Alguém já disse que é fácil amar ao amigo, muito mais difícil é amar àquele que nos contesta e dom Helder foi capaz deste amor incondicional, a ponto de colocar a vida e a segurança em risco.
Sua enorme dedicação não condizia com sua figura franzina e humilde. Ele agia não por considerar a ação um mérito, mas porque a tinha no seu íntimo como o dever de um cristão. Não agia para ser louvado como exemplo de cristão, mas porque uma ética profundamente arraigada em seu espírito não lhe mostrava outro caminho senão o que ele tão heroicamente seguiu.
Não tentou jamais ser herói, mas apenas um cristão consciente de suas responsabilidades com a humanidade; mas este desprendimento o fez ainda mais heróico e exemplar. É certamente um dos melhores exemplos que se pode ter de uma figura humana rara para a qual até a omissão - entendida como não fazer tudo que estivesse ao seu alcance pelos seus semelhantes - era um pecado terrível.
Dom Helder foi mais que um símbolo desta luta contra o individualismo, opondo a ele uma solidariedade radical que encarna o sentimento de Misericórdia extrema tão pregado e tão pouco colocado em prática pelas mais diversas fés.
Talvez isto explique porque a figura dele é tão querida até para quem não compartilha da crença cristã, como eu que sou muçulmano. Afinal ele se tornou um símbolo daquela dedicação ao próximo que todos os verdadeiros crentes de qualquer fé só podem admirar como um sinal da Misericórdia de Deus para com os homens.


Heduardo Pereira Brasil

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